segunda-feira, maio 29, 2006

MAYA, ILUSÃO, NELSON RODRIGUES E LEILA DINIZ...


MAYA,ILUSÃO, NELSON RODRIGUES E LEILA DINIZ

Texto: Valéria Lemos Palazzo



"O canalha é sempre cordial, um ameno, um amoral e costuma ter uma fluorescente aura de simpatia”. Nelson Rodrigues

"Todos os cafajestes que conheci na minha vida eram uns anjos de pessoas". Leila Diniz

Maya significa alguma coisa como ilusão ou fantasia, ou, filosoficamente falando, o “como se fosse”. Maya é uma espécie de sonho, uma espécie de transe mental. Na celebre peça de Pirandello “Assim é, se lhe parece”, o personagem principal, Lamberto Landisi, diverte-se ao dissecar, impiedosamente, as contradições das outras personagens da comédia dramática. Na busca da verdade de cada um, sempre conflitante com a dos outros, ele mostra como as coisas mudam totalmente de figura a cada olhar diferente, dependendo da pessoa que observa. Através dessa peça, Pirandello foi capaz de revelar os mais recônditos escaninhos da alma humana, escondidos, muitas vezes, por detrás do véu de Maya a “Ilusão”. Assim como Pirandello, Nelson Rodrigues e Leila Diniz com suas celebres frases acima, revelam uma figura humana muito comum, até mesmo obvia, porem escondida e transformada em algo que não é, através da ilusão de quem parece não vê-las assim... Como realmente são.

O que será que os “canalhas” em que Nelson se inspirou e os “cafajestes” de Leila têm em comum?
Talvez o que os una sejam as palavras, a aparência, e a "aura" de Maya que os envolve...
As palavras são magicamente convincentes. Xerazade, aquela das mil e uma noites, sabia bem disso, e foi através delas que conseguiu com que o sultão que matava uma esposa diferente a cada amanhecer; não só a poupasse de tal destino, como se apaixonasse por ela...

Os tais canalhas e cafajestes são obviamente sedutores. Preferencialmente pelas palavras... Parecem sempre dizer exatamente aquilo que queremos ouvir.
O mais incrível é que os atos. Afinal são os atos que realmente dizem quem são as pessoas... Não acompanham as ditas palavras, ou se acaso as acompanham são muito fugazes e tênues, nunca consistentes com o que é dito...
Por dentro tais pessoas parecem mais bonecos de ventríloquos, são "ocos". Por isso o que os torna convincentes "reais" são as palavras... Tais "bonecos" "falam", "falam", mas não agem...
Por isso nunca deveríamos acreditar apenas no que nos falam, mas deveríamos ir mais além.
Muitas vezes a ação esta presente, porem é completamente oposta ao que foi dito: “Me importo com o povo”, dito pelos políticos, se traduz em: “Só me importo comigo mesmo”. O gosto de você de certos homens, e vice versa, dito para uma mulher, se traduz em: “Eu uso você quando tenho vontade”.
O "Não faço diferença entre meus funcionários", dito pelo patrão, é desacreditado por gestos de total preferência a um deles...
O que acontece é que vemos o povo, a mulher ou os funcionários, das situações acima se perguntando: “mas ele (ela) disse que...”. Sim eles falaram, mas não fizeram... E lá ficam o povo, a mulher (ou homem), e o empregado angustiados, “buscando” em si falhas, defeitos ou erros, que pudesse ter cometido para não "merecer" o que o outro disse.
Meus caros não há nada de errado em vocês. A não ser certa ingenuidade e credulidade... Em aceitar palavras, mesmo sem “ver” atos, e também certo “comodismo” de ir alem das aparências.
Não busquem mais em si, não se culpem, mas tomem consciência do “outro”!
De repente o mundo está aí. Você acorda de um transe como acorda de um sonho. E o objetivo do crescimento, é perder cada vez mais suas "ilusões" e aproximar-se mais da verdade. Tanto da sua quanto da dos outros. Entrar cada vez mais em contato com o mundo “real”, ao invés de estar apenas em contato com palavras, aparências, posições, etc.
Essas são as contradições que Pirandello mostrou na peça. O obvio que de tão simples, às vezes não é reconhecido:
“Palavras são simplesmente palavras”. Cada um pode, e freqüentemente diz o que quer, até mesmo de maneira inconseqüente e leviana. Mas o que conta, o que realmente me diz quem tu és, são apenas, tão somente e simplesmente teus gestos. Palavras são reais quando ligadas a ações. Palavras são ilusões quando soltas, as tais “palavras ao vento”...
E aquele que pensa iludir pelas palavras, acaba sendo um iludido por elas. Talvez seja essa a “vingança” de Maya...

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